Temporal que se abateu sobre a Madeira deixou um rasto de escombros, mas uma imagem religiosa resistiu à destruição da respectiva capela |
A padroeira da diocese e da capital da Madeira, o Funchal, resistiu às intempéries, que mataram pelo menos 42 pessoas, segundo confusa estimativa oficial.
A pequena capela onde se acoitava o ícone da N.ª S.ra do Monte, no Largo das Babosas, e onde casou basta sorte de madeirenses, foi literalmente varrida da praceta anexa à paragem terminal do teleférico. À razia sobreviveu a imagem figurando a N.ª S.ra do Monte, incólume perante as enxurradas que destruíram a singela construção, datada de 1904. Se o templo capitulou, a felicidade do acaso poupou o ícone de barro e sugeriu, na óptica do pároco local, Giselo Andrade, novo culto mariano. Moldado na lama assassina das montanhas madeirenses.
"A N.ª S.ra do Monte já era mítica. A construção desta capela remonta a 1904, precisamente 50 anos depois da instituição do dogma da Imaculada Conceição", historia Giselo. "Mais do que isso, a maior romaria da ilha, que acontece a cada 15 de Agosto, é dedicada a Ela, pelo que é parte fundamental da identidade local", garante o padre de 29 anos, madeirense formado no Colégio Português de Roma.
O sagrado e o profano
Será por tanta referência e devoção que o jovem padre converte a desdita numa graça divina: "É um sinal", afirma. "Repare: a capela foi arrasada, mas salvou-se a imagem e não morreu ninguém aqui", diz. "Além disso, recuperámos um crucifixo enorme de prata, onde a figura de Cristo ficou incólume: o que é que isso quer dizer?", interroga-se, no meio do escarcéu provocado pelas máquinas limpando o largo de toda a sorte de escórias. Giselo, que é tão generoso na sua Fé, não carece das respostas que adianta com o fervor próprio dos esclarecidos: "Por detrás destas tragédias, há sinais a interpretar. Se a N.ª S.ra do Monte foi poupada, há que perceber o seguinte: a capela foi-se, mas Maria ficou. E ficou para nos proteger", alvitra.
Não obstante a mística mariana que anima o jovem pastor, cuja missão se tornou mais penosa face à intempérie - "as pessoas tendem a questionar a sua Fé", admite -, o pragmatismo irrompe com as motosserras esquartejando os troncos de eucaliptos que, à boleia das águas aceleradas, destruíram a capela: "Foi um sinal para a reconstrução. Não faltará gente solidária para edificar novo templo", diz. Afinal, não se trata apenas de uma casa de devoção: "Isto é também um símbolo identitário. Se agora era apenas uma capela mortuária, foi aqui que se celebrou a maioria dos casamentos da zona, como o dos pais de Joe Berardo", diz, sublinhando: "E Portugal tem, desde a Idade Média, Santa Maria por divisa.
"O templo vai renascer com novo simbolismo", garante.
Jornal de Noticias
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