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sábado, 25 de abril de 2009
35 anos apos a Revolucao de Abril
O desemprego ou o mais ténue temor de perder o posto de trabalho cerceiam as liberdades do indivíduo. A noção de classe esfumou-se. A perda de emprego é, numa sociedade individualista, um falhanço pessoal. A felicidade fica em causa.
Trinta e cinco anos decorridos sobre a Revolução de Abril, Portugal enfrenta a mais séria crise económica. Nunca houve tantos desempregados. Mas viver em democracia não é um passaporte para uma roda livre de liberdades. "O papel instrumental da liberdade diz respeito ao modo como os diferentes tipos de direitos, oportunidades e habilitações contribuem para o alargamento da liberdade humana em geral", afirma o Prémio Nobel da Economia Amartya Sen, no livro "O Desenvolvimento como Liberdade".
"Quem não tem dinheiro ou emprego pode não ter, por exemplo, acesso aos melhores advogados. A pobreza diminuiu socialmente as pessoas", afirma o filósofo José Gil. "Ficar desempregado é perder a função que desempenhamos na sociedade. Perdemos a utilidade que é reconhecida pela remuneração", considera o sociólogo político (politólogo) e investigador Reinhard Naumann.
Mas será que ficar desempregado é uma provação comparável, nas suas características mais intrínsecas, à experiência dos afectados em crises passadas? Perdeu--se a consciência de classe, isto é, do colectivo. "Se falamos de 1974, devemos recordar que a seguir houve a crise do petróleo. Qual é a diferença entre os dois períodos? A acção colectiva é hoje menor. A resistência de baixo para cima é actualmente mais difícil. Há hoje menos vida colectiva", sublinha Naumann. "Totalmente entregue a si próprio, o indivíduo vê como uma questão pessoal aquilo que, efectivamente, é uma realidade económica e social", escreve o filósofo Gilles Lipovetsky, no seu livro "A Felicidade Paradoxal".
"Num primeiro momento, o desempregado sente que foi despromovido e pode também surgir o sentimento de culpa. Sente-se inseguro porque perde o controlo da sua vida e não sabe até quando. Do ponto de vista psicológico, há uma perda da auto-estima. É importante o apoio da família", afirma Maria Gouveia Pereira, professora do Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA).
Para quem tem emprego, a conjuntura económica lança fantasmas e alguns empregadores não hesitam em cometer abusos. "As pessoas não querem fazer ondas para não perder o emprego. A insegurança aumenta quando o desemprego começa a afectar amigos e familiares", diz a professora do ISPA.
Marinús Pires de Lima, sociólogo do ISCTE, alerta para a exclusão mais extrema. "O desemprego contribui para o desencorajamento. Se não conseguem emprego às primeiras tentativas, as pessoas deixam de procurar os centros de emprego. Desistem. Apesar do alargamento recente do subsídio, a verdade é que os desempregados sofrem na sua auto-estima, com reflexos na vida familiar e na relação com o seu ambiente em geral".
Já Adam Smith (1776), em "A Riqueza das Nações", alertava para o facto de num país rico ser necessário maior rendimento para realizar os mesmos desempenhos sociais. "A felicidade não deve passar por ter três telemóveis. A felicidade alcança-se com a liberdade de escolha", afirma José Gil.
Marcas sociais
medo
"Há diversos medos que são facilmente espalhados e interiorizados. Medo de perder o emprego ou de exprimir opiniões. As pressões e influências do poder político são sentidas em vários domínios".
José Gil, filósofo
estilo de vida
"As pessoas dificilmente abdicam do seu estilo de vida. Um dos problemas mais graves é esse".
Marinús Pires de Lima , sociólogo
escolha
"A perda de liberdade também é visível nos jovens que acabam os seus cursos superiores e não conseguem emprego. Continuam dependentes dos pais. Não têm escolha".
Maria G. Pereira, psicóloga
identidade
"O trabalho cria a nossa identidade social. Viver no medo de perder o emprego é algo contrário à liberdade. Numa conjuntura de crise, ficamos constrangidos e há tendência para o autoritatismo."
Reinhard Naumann, politólogo
Obsessão
"O desemprego tornou-se obsessivo para as consciências individuais, recolocando em questão a identidade pessoal e social. [O desemprego] é agora encarado como uma humilhação".
Gilles Lipovetsky, filósofo
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