A lei da droga foi objecto de uma alteração que ninguém consegue explicar. A "mexida" aconteceu numa recente republicação integral da legislação, de 1993. O "erro" foi entretanto corrigido e classificado como "lapso fortuito".
Em causa está o artigo 40.º da lei que pune o "tráfico e consumo de estupefacientes e de substância psicotrópicas". Esta norma pune o "consumo", "cultivo", "aquisição" ou "detenção" de droga, mas na versão alterada e publicada em Diário da República do passado dia 11 de Maio foram retiradas todas as expressões, à excepção de "cultivo".
A "nova" versão do artigo 40.º que veio a constar na republicação integral do decreto-lei - na sequência de pequenas alterações a outros artigos - causou polémica no meio judicial. Isto porque apenas os artigos 15.º 16.º tiveram alteração aprovada pelo Parlamento e não se compreende como pôde um artigo ser modificado substancialmente naquelas circunstâncias.
A republicação integral - em que tal não deveria acontecer e nem é permitido.
Após contactos com o Ministério da Justiça, Presidência do Conselho de Ministros e Ministério dos Assuntos Parlamentares foi explicado que, afinal, o artigo em causa "não foi alterado". "Houve apenas um lapso fortuito, razão pela qual a Assembleia da República vai publicar uma declaração de rectificação", esclareceu a assessoria do ministro dos Assuntos Parlamentares. A rectificação foi publicada no passado dia 22 de Junho.
De acordo com fontes judiciais, a alteração em causa parecia ir no sentido de descriminalizar completamente o consumo de estupefacientes. Um cenário recusado, no ano passado, pelo Supremo Tribunal de Justiça, num acórdão de uniformização de jurisprudência.
Esta decisão foi proferida no termo de uma discussão, nos tribunais, sobre se, com a publicação de uma lei em 2000, todo o consumo de droga teria sido, ou não, completamente liberalizado, deixando de ser crime e passando a ser, somente, contra-ordenação.
A maioria dos juízes-conselheiros entendeu que descriminalização não é o mesmo que liberalização. E que, portanto, continuaria a ser crime - e não contra-ordenação - a posse, aquisição e detenção de drogas, mas em quantidades superiores a 10 doses diárias.
A mexida na lei ia no sentido da posição minoritária do Supremo - apenas seria punido o "cultivo". Mas o artigo voltou à forma inicial.
"É evidente que outra coisa não podia acontecer, porque as leis são feitas pelos deputados ou pelo Governo e não pelas secretarias oficiais. Mas houve ali uma 'mãozinha marota' e não foi na Imprensa Nacional seguramente. Em conclusão: doravante temos de estar atentos às republicações", escreveu Eduardo Maia Costa, juiz do Supremo, no blog "Sine Die".
Lei correcta
Consumo
1 - Quem consumir ou, para o seu consumo, cultivar, adquirir ou detiver plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a IV é punido com pena de prisão até 3 meses ou com pena de multa até 30 dias.
2 - Se a quantidade de plantas, substâncias ou preparações cultivada, detida ou adquirida pelo agente exceder a necessária para o consumo médio individual durante o período de 3 dias, a pena é de prisão até 1 ano ou de multa até 120 dias.
3 - No caso do n.º 1, se o agente for consumidor ocasional, pode ser dispensado de pena.»
Lei mexida
Consumo
1 - Quem cultivar plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a IV é punido com pena de prisão até 3 meses ou com pena de multa até 30 dias.
2 - Se a quantidade de plantas, substâncias ou preparações cultivada pelo agente exceder a necessária para o consumo médio individual durante o período de 3 dias, a pena é de prisão até 1 ano ou de multa até 120 dias.
3 - No caso do n.º 1, se o agente for consumidor ocasional, pode ser dispensado de pena.»
Sem comentários:
Enviar um comentário